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Me deparei ontem com um comentário no Facebook feito por um amigo afirmando que um ator se portava como viado, no sentido de efeminado, mais delicado e menos “machão”, o que faria com que ele não se enquadrasse como um simbolo sexual portanto não seria uma figura que despertaria interesse nas mulheres.
A pessoa que realizou o comentário não tem traços de homofobia e tampouco se mostrou machista durante os anos que nos conhecemos; porem teve uma atitude muito comum a todos nós: não consegue enxergar o peso de seus pequenos comentários.
Cada um tem sua opinião, cada um tem seu gosto, porém a generalização dessa opinião e desse gosto acarreta uma série de questões e para aponta-las vou precisar dar uma pequena volta pela questão da igualdade entre homens e mulheres, mas tudo muito breve e até sinto dizer, um pouco superficial.
Milhares de anos atrás por serem fisicamente mais fortes do que a mulher os homens passaram a se considerar e serem considerados superiores que seus pares femininos.
Séculos se passaram e no começo do século 20, com a primeira guerra mundial (1914- 1918) e a morte de milhares de espécimes masculinos, passaram elas a exercerem as funções antes dedicadas apenas a eles, incluindo o voto (1918 na Inglaterra), ato indispensável nos sistemas democráticos.
Note que isso faz apenas 95 anos, há chances de você inclusive conhecer alguém vivo com essa idade. No Brasil, esse tempo é mais curto ainda, o primeiro voto feminino foi em 1932, 81 anos atrás.
Mas tudo é processo, temos mais de 2 mil anos de uma humanidade que acreditou que a mulher era inferior ao homem contra 95 anos de direitos igualitários, falando restritamente de voto.
Avançamos e chagamos então à década de 60, onde a pílula anticoncepcional foi inventada: rompemos em tese, a última barreira para a liberdade feminina, onde a mulher deixa de se tornar fragilizada ou passível de proteção por estar gerando outra vida.
Até a pílula ser amplamente utilizada e normatizada contamos uma década, ou seja, anos 70, 43 anos atrás.
Se pensarmos superficialmente 43 anos é o suficiente para eu com 20 e poucos anos já não ter vivido uma discriminação massiva contra mulheres, 43 anos fez com que meu pai e minha mãe achassem que eu deveria saber realizar tarefas domesticas, 43 anos fez com que eu soubesse que em questões de direitos e deveres não existe distinção entre homens e mulheres.
Mas 43 anos não foi suficiente para toda a sociedade. Nesses 43 anos a publicidade se intensificou, os padrões de beleza ficaram cada vez mais rígidos e instaurou-se uma confusão: como deve ser um homem e uma mulher, quando perdem seus papeis tão bem desenhados?
A resposta é simples: como ele e ela quiser, mas a sociedade precisa de rótulos, precisa de uma meta a se atingir portanto definiu-se que a mulher tem que ter força, garra mas deve ser principalmente “feminina”, curvilínea e bem arrumada enquanto o homem tem que ser “macho”, másculo, bruto, ainda que só superficialmente porque ele precisa ser no fundo educado, respeitoso e ter estilo.
Ao desqualificar o ator como viado e efeminado, e portando, não qualificado para os padrões estabelecidos para um simbolo sexual meu amigo justifica: mas o que tem de errado se gostar de alguém másculo, ou de alguma mulher por ser feminina? Sempre teremos artistas que serão símbolos sexuais por essas características, afirmou ele.
Respondo então depois de toda essa volta: Não é porque “sempre teremos” ou porque “sempre tivemos” símbolos sexuais nesse molde masculino voraz e feminino delicado que significa que ele é certo.
E vou um pouco além, inconscientemente, acredito que meu amigo repita uma falha histórica: ao tratar o ator como viado (no sentido de efeminado) ele afirma que aquele homem é menos homem, portanto mais mulher, portanto algo menor em relação ao homem, e menos interessante para a própria mulher.
É preciso que nos policiemos individualmente para que terminemos com os rótulos, sejam eles quais forem, principalmente se esses rótulos forem associados ao másculo e ao feminino. Hoje, 43 anos depois as mulheres ainda ganham menos, são ainda assediadas verbal e sexualmente e esse pequenos comentários estimulam que essas coisas sejam consideradas normais, eles não podem acontecer, precisamos parar de achar normal essa dualidade tão arraigada do forte e agressivo masculino e do frágil feminino, passível de coerção.
Por se tratar de um debate e não uma briga esse amigo afirmou que acha que minha posição é extrema, chata e até um policiamento do politicamente correto, mas veja bem, meus debates não são a esmo, eu busco tê-los com quem tem abertura e repertório para dialogar e se não puder faze-lo com quem está próximo, como posso querer mudar algo em larga escala?
Posso sim estar sendo extremo, e até um pouco chato, mas tendo em vista que uma questão pra mim tão clara e tão errada como o desrespeito continuo contra as mulheres me dou ao direito de fomentar debates, principalmente com quem me é caro, quem sabe com mais pessoas extremas e chatas no mundo, com questões grandes e pequenas, a gente não consiga finalmente ser igual?